A saga dos "2 Filhos de Francisco" - Parte I
Camargo e Camarguinho: foi assim que começou. Fã de Tonico e Tinoco, seu Francisco, um lavrador de Pirenópolis, cidadezinha do interior de Goiás, acalentava um sonho: ter dois filhos homens que pudessem formar uma dupla sertaneja. Quando nasceu Mirosmar José, o primogênito da família Camargo, cobrou da mulher, dona Helena: "Agora precisamos da segunda voz.." Um ano depois nascia Emival, o parceiro que faltava.
Sim, você já viu esse filme em algum lugar, mas falemos desse assunto mais adiante.
Quando Zezé, o filho mais velho, completou três anos, ganhou do pai uma gaitinha. Mais tarde, com o dinheiro que vinha da lavoura, seu Francisco comprou uma sanfona e um cavaquinho para os filhos, que àquela altura já formavam a dupla Camargo e Camarguinho. "Como eles tinham vergonha, eu dava dinheiro escondido para os outros pagarem os dois depois que cantassem. Era para incentivar", relembra seu Francisco. A dupla-mirim se apresentava em circos e rodoviárias.
Em 74, a família foi para Goiânia, abrigando-se num barraco de dois cômodos. A dupla Camargo e Camarguinho, que tocava canções de Tonico e Tinoco e de outras duplas da época, vez ou outra ganhava a estrada para se apresentar no interior do país. E foi numa dessas viagens, na volta de Imperatriz, no Maranhão, que um acidente de carro tirou a vida de Emival, com 11 anos.
"Éramos os irmãos mais ligados. Fiquei traumatizado por um ano", revela Zezé.
Aos 13 anos trabalhava como office-boy. Aos 15, recuperado da fatalidade, já era o Zé Neto do trio Os Caçulas do Brasil, com quem chegou a gravar um disco.
Em 79 formou parceria com um amigo de Goiânia, remanescente do trio.
A carreira da dupla Zazá e Zezé, que teve boa expressão em Goiás e no Mato Grosso, deu origem a três LPs. Mas não vingou porque Zazá tinha planos regionais. Zezé queria ganhar o país.
Em 1987, Zezé partiu para São Paulo, em busca de carreira solo. Gravou dois discos pelo selo Três M, já extinto (hoje esses trabalhos pertencem à Continental). Nessa época, algumas de suas composições já eram sucesso nas vozes de duplas consagradas, como Chitãozinho e Xororó.
"Apresentei 'Solidão' ao Leonardo, mas achava que ela deveria ser gravada pelo Amado Batista. Mas o Léo gostava muito da canção. Fez um playback sem me avisar. Só contou quando já tinha decidido gravá-la", lembra Zezé.
A música acabou estourando nas vozes de Leandro e Leonardo.
Luciano entra em cena - Parte II
Apesar das composições bem-sucedidas, o filho mais velho de seu Francisco queria mesmo era emplacar como cantor. Welson David, irmão 10 anos mais novo, imaginava que Zezé estivesse fazendo sucesso em São Paulo. "Vi você no programa do Bolinha", ligava, orgulhoso. Luciano nem desconfiava que quem segurava as pontas - e as contas - na casa de Zezé era, muitas vezes, Zilu, sua mulher.
Welson trabalhava como office-boy em Goiânia, mas já começava a soltar a voz.
"Ele cantava no clube da Caixego (Caixa Econômica de Goiás, onde era funcionário), recorda-se dona Helena.
No Natal de 1989, o mano mais velho foi visitar a família em Goiânia. Welson aproveitou para mostrar o que havia aprendido.
"Vi que ele tinha tino para a coisa", lembra Zezé. "Comentei com a Zilu e ela deu a maior força, afinal era meu irmão, novinho, boa pinta e sem vícios."
Zezé precisava mesmo encontrar um parceiro. Ele estudava propostas de algumas gravadoras, que só fechariam contrato se o cantor formasse novamente uma dupla.
E assim foi feito. Ensaia daqui, ensaia de lá, Zezé posou de maestro até ganhar o timbre certo de sua outra metade. Na hora de escolher o nome da dupla, a questão era: o que combinaria melhor com Zezé Di Camargo.
"Por que não Luciano?", sugeriu Welson.
Fechado. E assinaram contrato com a gravadora Copacabana.
Com o repertório definido e faltando um dia para a dupla entrar em estúdio, Zezé teve um estalo e compôs, de supetão, "É o Amor". Insistiu com os executivos da gravadora e conseguiu incluir a faixa no LP. Antes mesmo de o disco sair, foi o próprio Zezé Di Camargo quem deixou uma fita com "É o Amor" na rádio Terra de Goiânia.
Seu Francisco, sempre incentivador, comprava 500 fichas telefônicas por semana e as espalhava pela vizinhança.Pedia que ligassem para a rádio e solicitassem a música que seus meninos haviam acabado de gravar.
Funcionou: em 15 dias "É o Amor" era a mais pedida da cidade.
(Partes III e IV amanhã)
Rosely Rodrigues
Texto: Arleyde Caldi
Fotos: Divulgação e Rosa Marcondes